PUBLICADO EM 08/10/17 - 08h54
Quem é contrário à essas manifestações artísticas levanta o argumento do respeito à religião, presentes em algumas obras. “As legislações defendem instrumentos religiosos. É crime atentar contra um símbolo religioso. Dentro da normalidade, é tranquilo contestar a religião, mas não é possível ter uma obra em que alguém ejacula na cruz, símbolo maior do Cristianismo. Que arte é essa? Essa aberração é uma afronta à fé das pessoas”, afirma o deputado estadual João Leite, que junto a outros políticos tem levantado documentos para estruturar uma defesa, via instrumentos legais, em relação aos trabalhos em cartaz em Belo Horizonte. “Vamos ao Ministério Público e vamos ao debate”, diz.
Já o vereador Jair di Gregório declara “não estar discutindo as obras de arte, mas os crimes que estão sendo violados”. E continua: “A exposição do Palácio das Artes tem um quadro em que Cristo está enfiando a mão no órgão sexual de uma mulher, fazendo sexo com animal. Isso é caro para nós, cristãos. Eles chamam de arte, eu chamo de lixo”, afirma. Perguntado sobre o poder contestatório das artes, afirma não se tratar disso. “Para mim é apologia. Queria ver essas pessoas mexendo com o povo islâmico, com Maomé. Eles matam. Por isso, mexem com cristãos, porque somos da paz”, completa o vereador que se posiciona também contra a peça protagonizada pela atriz e travesti Renata Carvalho, ainda que não tenha assistido ao espetáculo. “Mas vimos fotografias e já basta”, diz o líder da bancada cristã na Câmara dos Vereadores de Belo Horizonte.
As obras que foram alvo de manifestações contrárias dizem respeito a gênero, sexualidade e nudez. “Não é a arte que está sendo censurada, é a vida. É o corpo, a fronteira mais sensível, o grande espaço de disputa. É o afeto. É o corpo enfrentando o patriarcado que gera toda essa discussão. Está em questão um jogo de linguagem que vai jogar com o tabu, com o interdito, com o que não se fala, com o que não se quer que seja denunciado”, comenta Ana Luisa Santos.
Para Marina Câmara, crítica, curadora e pós-doutoranda da USP, as reflexões artísticas desaparecem da discussão em função de outros atravessamentos. “Encontraram na arte um gatilho. Essas tentativas surgem como um componente na paisagem da intolerância, é um elemento que compõe esse quadro de homofobia, transfobia e feminicídio”, diz.
Renata, que interpreta Jesus trans a partir da peça da escocesa Jo Clifford, dá outra dimensão. “Esses ataques em nome de Deus é transfobia. Eles são contra o corpo trans. Estamos falando da censura às artes, mas nós somos marginalizadas e censuradas no nosso cotidiano”, afirma a atriz.
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