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domingo, 30 de julho de 2017

Perigo disfarçado de conto de fada

Rio - Alerta vermelho para os pais que deixam filhos pequenos assistirem a desenhos e vídeos no YouTube: criadores mal-intencionados estão disseminando vídeos supostamente infantis, mas que escondem conteúdos explicitamente violentos e sexuais, incluindo cenas com agulhas, insetos, abuso, espancamento, aborto, escatologia e outros temas inapropriados para crianças. O fenômeno foi batizado por internautas de ‘Elsagate’ — em alusão à famosa personagem Elsa, da animação Frozen, da Disney; e ao escândalo político Watergate. 
Alguns vídeos são animações que imitam personagens infantis icônicos, como super-heróis, princesas e outras criaturas. Outros são filmagens ‘live action’, ou seja, atores — adultos e crianças — fantasiados como os personagens. Os vídeos estão no YouTube sem censura e são marcados por palavras-chaves infantis. 

Desenhos infantis com conteúdo inapropriado começam geralmente com imagens de reunião de personagens que atraem as criançasReprodução

Dessa forma, uma criança que entra para assistir um desenho normal pode acabar sendo levada a estes vídeos através da reprodução automática do site, que procura vídeos relacionados através das palavras-chave. Como o conteúdo vem disfarçado de infantil, os responsáveis pela criança podem não perceber o que está acontecendo logo de cara. 
A estudante Jessica Luiza, 21 anos, se assustou ao ver uma postagem alertando sobre o perigo, e reconheceu um dos vídeos — seu irmão de 3 anos vinha assistindo esses conteúdos. “Ele vai para o YouTube toda noite quando chega da escola. Volta e meia canta as músicas e pede para ver esses vídeos bizarros. Ele já chegou a tentar imitar, querer bater, assim como viu nos vídeos. E nossa mãe nunca havia percebido”, relatou. 

Atitudes polêmicas utilizando crianças são reprovadas por psicólogosReprodução

A também estudante Nathalia Reis, 19 anos, soube do ‘Elsagate’ em um grupo do Facebook e fez uma postagem de alerta em seu próprio perfil, alcançando milhares de curtidas, compartilhamentos e comentários. E se assustou porque, segundo ela, seu cunhado de 4 anos de idade também passa o dia assistindo vídeos: “Sempre fiquei incomodada. Tento levar ele para o ar livre, parques, mas ele tem medo de tudo. Pedi que a mãe dele ficasse de olho”. 

Especialistas veem ligação com redes de pedofilia
Ela também se impressionou com a repercussão da postagem: “Mães comentaram que os filhos assistiam esses vídeos e até choravam. Algumas se assustavam porque os filhos sabiam de onde vêm os bebês sem que elas nunca tivessem ensinado sobre isso. Crianças com medos e fobias. Foram vários relatos”, conta.
Até mesmo especialistas estão recebendo as informações com surpresa. Segundo Elaine Vidal, que é coordenadora de graduação em Comunicação do Ibmec e leciona Criação e Produção para Mídias Digitais na UFRJ, ao plagiar personagens patenteados, os vídeos violam direitos autorais e deveriam ser tirados do ar. “
Outros vídeos, por muito menos, são bloqueados pelo Youtube”, diz. Outro aspecto alarmante é que os vídeos não são monetizados — ou seja, as visualizações não geram receita para o autor —, e são muito bem produzidos, o que costuma custar caro. “Certamente é um objetivo assustador, se não é dinheiro. É bem provável que haja relação com redes online de pedofilia”, afirma Elaine. 
Márcio Gonçalves, professor do Ibmec e especialista em mídias digitais, concorda: “São produtores de conteúdo que não têm interesse em ganhar dinheiro. O objetivo é transmitir mensagem a quem assiste”. 

Há cenas de insinuação de sexo envolvendo personagens infantisReprodução

Ele lembra que o público não é só o infantil: “Os comentários provavelmente são escritos por adultos. A questão dos pedófilos é forte, uma comunidade que se protegem. Fica explícito que há relação com as redes de produção de conteúdo pedófilo e pornográfico”.
Pais devem acompanhar
Para o professor Márcio Gonçalves, o mais importante é o monitoramento dos pais: “Essa infância conectada está tendo fácil acesso a conteúdos impróprios, que vão moldar sua personalidade”, avalia.
A psicológa Laura Calejon, doutora em Psicologia Escolar e Desenvolvimento Humano, alerta para o perigo do uso da internet sem supervisão. “Há casos de crianças com graves problemas no desenvolvimento da linguagem, que chegam a ser confundidas com autistas, porque usaram tablet e celular demais e desde muito cedo”, afirma. 
Sobre os vídeos Elsagate, especificamente, o perigo é ainda maior, segundo os especialistas no assunto. “Há imagens muito conflitantes, contraditórias. Sem dúvida os estímulos têm efeitos subliminares. E quanto menos compreensíveis forem, mais fortes são os impactos”, analisa. 
Já sobre os objetivos dos produtores dos vídeos, ela concorda com os demais especialistas: “É possível que uma rede de pedófilos se valha disso, não é uma hipótese descabida”, acrescenta. 
O principal, segundo a psicóloga, é que os pais acompanhem seus filhos com cuidado. “O audiovisual é importante no desenvolvimento da criança, mas é necessária a presença de um adulto que compartilhe com ela, vá ajudando, explicando o que ela pode não entender. Não dá para substituir a presença de um adulto por tecnologia”. Pais devem estar atentos ao conteúdo assistido pelos filhos sempre.
Reportagem da estagiária Nadedja Calado, sob supervisão de Joana Costa.
http://odia.ig.com.br/rio-de-janeiro/2017-07-30/perigo-disfarcado-de-conto-de-fada.html

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