Papel de parede volta de Jesus
"ENTREGA TEU CAMINHO AO SENHOR, CONFIA NELE E O MAIS ELE FARA".
SALMOS 37.5

sexta-feira, 12 de abril de 2013

UM, DOIS OU TRÊS ISAÍAS?



                                                         


Alguns teólogos defendem a existência de três
“Isaías” e não apenas de um escritor para o livro do profeta. Como pode ser isso?
O conceito tradicional da inspiração dos livros da Bíblia é composto de uma
imagem que logo nos vem à mente: o hagiógrafo sentado em seu local de trabalho,
escrevendo o livro bíblico e, sobre ele, o símbolo do Espírito Santo incidindo
diretamente sobre sua mente, para que escreva palavra por palavra ditada por
Deus. Tal é o conceito da inspiração chamada “mecânica”. Esse conceito tem dado
lugar cada vez mais ao processo dinâmico da inspiração. Aqui não se anula a
verdade da inspiração divina, mas o que se questiona é como ela acontece. Assim,
se um só livro da Bíblia fosse da autoria de mais de um escritor, isso não
comprometeria o seu aspecto inspirativo (RIDDERBOS, 1986, p.17). É o que ocorre
com o livro do profeta Isaías. Mas a simples crença nessa possibilidade não é
suficiente para prová-la. É necessário estar munido de argumentos que esclareçam
e evidenciem esse conhecimento. Admite-se hoje que nem sempre os profetas que
pregaram foram os mesmos que escreveram suas mensagens. Houve casos em que
os próprios profetas receberam de Deus ordem para escrever suas mensagens, mas
também, muitas outras vezes, o conteúdo da fala desses profetas foi preservado por
discípulos (Is.8:16; Jr.36), com o objetivo de serem ensinadas no futuro. Admite-se
até que “esses discípulos podem ter editado os textos para encaixá-los em novas
circunstâncias e, em certos casos, até adicionado alguma coisa às profecias”
(MILLER, 2006, p.33). A própria Escritura faz menção em Is.16:13-14 de uma adição
posterior feita a uma profecia anterior, referindo-se às pregações contra Moabe
(caps.15 e 16 de Isaías). Temos um outro exemplo em Is.38:9-22 de um escrito
atribuído ao rei Ezequias (ou aos seus escribas).
A crença mais comumente difundida é a de que o Isaías de Jerusalém do
Século VIII a.C., foi o escritor dos 66 livros que compõem o livro. Esse homem, filho
de Amoz (não o profeta), foi chamado por Deus quando ainda era muito jovem no
ano em que morreu o rei Uzias (740 a C), fato que muito o abalou. A maior parte de
sua vida parece ter sido gasta como pregador da corte ou como capelão do rei. De
acordo com o próprio texto (1:1) Isaías estendeu o seu ministério por um período
de 40 anos, durante o reinado dos reis de Judá Jotão, Acaz, e Ezequias. Era um
homem de intelecto poderoso e notável força de caráter. Durante todo o seu
ministério profético, Isaías condenou a hipocrisia de uma sociedade que se
contentava com encenações cultuais sem conseqüências para a vida prática. Para o
profeta, o Senhor rejeita o culto prestado por um grupo que está estruturado na
injustiça (1:10-20). Outras ênfases deste profeta foram:
 * O anúncio do inimigo como instrumento do juízo divino para com o seu povo
Judá (10:5). Possui um tom funesto mais forte que aquele visto em Oséias e Amós.
 * Ênfase ao tema da santidade de Deus (Cap. 6). A sua visão inaugural está cheia
de detalhes de resplendor e glória que permeiam essa santidade.
 * A mensagem de Deus é vista de uma forma mais ampla e ilimitada, voltada não
somente para o seu país, mas também a toda a comunidade internacional (Caps.
10-23). * Não obstante a realidade do juízo divino, Isaías prega sobre “o resto”, um fio de
esperança para um futuro difícil. Esse resto fiel realizará todas as gloriosas
promessas do futuro (6:13; 7:32; 10:20).
Os teólogos mais conservadores admitem apenas a divisão do livro em três
partes, mas não a sua autoria tripartida. O máximo que essa concepção admite é que as
palavras do profeta foram conservadas e receberam poucos acréscimos por parte de seus
discípulos. Mesmo que se aceite essa posição tradicional pode-se verificar que até os 39
primeiros capítulos de Isaías não estão distribuídos numa ordem cronológica exata, de
acordo com os reis da época, conforme podemos verificar no quadro abaixo:
DISTRIBUIÇÃO DAS MENSAGENS DO PROTO-ISAÍAS DE ACORDO COM OS
REIS DA ÉPOCA:
REI PERÍODO TEXTOS
Jotão 740 – 734 a
C
1:10-20; 1:21-26; 2:6-21; 3:1-15; 3:16 a 4:1; 5:1-
7; 5:8-25; 5:26-30; 10:1-4;
Acaz 734 – 727 a
C
7:1-17; 7:18-25; 8:1-4; 8:5-8; 8:9-10; 8:11-15;
8:16-20; 9:7-20; 17:1-11
Ezequias
(menino)
727 – 715 a
C
14:28-32; 18:1-7; 20:1-6; 28:1-4; 28:7-13; 28:14-
22; 30:8-17
Ezequias
(adulto)
714 – 698 a
C
1:4-9; 10:5-16; 10:27b-34; 14:24-27; 28:23-29;
29; 30:1-7; 30:27-33; 31:1-9; 32:1-8; 32:9-14; 33;
Um dos primeiros a questionar a única autoria do livro de Isaías foi o Rabi
Abraham ben Meir ibn Ezra, por volta de 1150 d.C. Já, entre os teólogos cristãos,
desde a segunda metade do Sec.XVIII d.C., os capítulos 40 a 66 têm sido colocados
em data posterior à do Isaías de Jerusalém (KOPPE e DODERLEIN apud
RIDDERBOS, 1986, p.25). É o caso de Johan Christoph que em 1775 d.C., formulou
a hipótese de que os capítulos 40 a 66 teriam sido escritos por um poeta, décadas
depois da produção da primeira parte do livro. Christoph foi seguido por
Eichhorn, em 1782 (VAN DEN BORN, 1977, col.743). Nos meios conservadores
protestantes também há quem pense dessa forma: o erudito teólogo batista
A.R.Cabtree (1967, p.15-18) defendeu a possibilidade da existência de dois blocos
de textos de Isaías, um escrito pelo próprio Isaías de Jerusalém (caps.1-39) e o
outro, por um discípulo no pós-exílio (caps.40-66). Para Cabtree (ibdem), o Isaías
de Jerusalém não poderia ser o autor desses capítulos pelos seguintes motivos:
a) As circunstâncias históricas apresentadas nessa parte são bem diferentes
daquelas referentes aos capítulos 1 a 39. Já não se falava mais sobre a Assíria,
grande potência do oitavo século antes de Cristo, o reino do norte de Israel já não
mais existia e Jerusalém estava em ruínas por causa da destruição ocorrida em 586
a.C., empreendida pelos babilônios.
b) O contexto inicial do capítulo 40 dá a entender essa primeira idéia. Se nos
capítulos anteriores as mensagens eram duras e de condenação, a partir do capítulo
40 (vv.1-2) elas aparecem como consolação: “Consolai, consolai o meu povo, diz o
vosso Deus. Falai benignamente a Jerusalém, e bradai-lhe que já a sua malícia é
acabada, que a sua iniqüidade está expiada e que já recebeu em dobro da mão do
Senhor, por todos os seus pecados”. Observe-se aqui que o texto fala que Jerusalém já recebeu em dobro o castigo do Senhor. Por castigo, entenda-se aqui a destruição
da cidade e o exílio de 70 anos na Babilônia.
c) Ainda nesse pensamento das circunstâncias históricas, o profeta menciona o
nome de Ciro (44:28 e 45:1), rei dos medo-persas, reconhecendo nele o instrumento
de Deus para libertar o povo do cativeiro. “Os profetas dirigiram as suas
mensagens aos seus contemporâneos, apresentando-lhes verdades eternas da
revelação divina que receberam do Senhor para o seu próprio povo” (ibdem),
situando assim o profeta em seu contexto. Nesse sentido convém entender que a
onipotência divina poderia transportar um profeta a um futuro longínquo,
retirando-o do presente e alterando suas imagens e pensamentos. Mas isso supõe o
desdobramento de sua personalidade e o esquecimento dos contemporâneos para
os quais ele foi enviado (GORGULHO, 2002, p.1238).
d) Apesar de não existir muita diferença no vocabulário das duas partes do livro, o
estilo literário da segunda parte é, de acordo com Cabtree (ibdem), claramente
diferente dos capítulos anteriores. Assim compara os autores das duas partes do
livro:
O seu estilo (o de Isaías 1 a 39 – grifo nosso) é geralmente
conciso, sólido e frequentemente austero, com o movimento
majestático e imponente dos seus períodos retóricos. Sabia
caracterizar com poucas palavras os homens e os reis fracos e
arrogantes. Peca, o rei de Israel, e Rezim, rei da Síria, são dois
pedaços de tições fumegantes...O autor dos capítulos 40-55
era poeta lírico. A sua linguagem é mais fluente, mais
apaixonada, mais emocional, mais alegre e mais exuberante
do que a linguagem forte de Isaías, que se sentiu impelido a
criticar, admoestar e até ameaçar o seu povo frequentemente
com o castigo divino.
e) Apesar das afinidades de vocabulário e semelhanças na teologia, as diferenças
são mais consideráveis. Por exemplo:
* A mensagem dos capítulos 40 a 55 é caracteristicamente de libertação,
comunicando aos exilados que o castigo terminou (40:1-11; 45:1-13). Ciro é
“ungido”, instrumento de Deus no processo de libertação. O fim do exílio é visto
como um novo êxodo e, como no primeiro, o Senhor seria o garantidor dessa
libertação.
 * Se os primeiros 39 capítulos de Isaías criticam a idolatria caracterizada pelo culto
cananeu dos lugares altos, a idolatria que os capítulos 40 a 55 criticam é a religião
erudita e suntuosa da Babilônia. Essa crítica está baseada numa pregação do
“monoteísmo absoluto” (desenvolvimento teológico) e, por conseguinte, da
soberania de Yehweh. Unicamente ele é Deus. Os outros deuses são apenas pedaços
de madeira, não são nada (40:18-19; 42:17; 44:6-20).
 * Desse monoteísmo extrai-se o fato de que Deus é o único salvador (45:17-24). * O seu interesse pelo passado é grande (41:18; 43:3; 51:1-4; 54:9). Anuncia assim o
Deus-Criador como base de sua soberania sobre todos os povos (40:12; 43:1; 44:21-
24;45:18).
 * O povo de Deus oprimido, mas convertido é denominado de “Servo de Ye
hweh”.
Uma vez liberto, se tornará missionário, uma luz para que as nações se voltem para o
Senhor, verdadeiro Deus.
No final do século XIX, porém, o alemão Bernard Duhm (apud CABTREE,
1967, p.20), em seu comentário a Isaías, defendeu que a segunda parte (40 a 66)
deveria ser subdividida em duas partes, devido à existência de contextos históricos
diferentes. Ele destacou ensinamentos típicos de uma terceira parte, distinguindoos do conjunto dos capítulos 1 a 39 e 40 a 55 do livro. Esses ensinamentos davam
continuidade, por parte de discípulos, às pregações contidas nos capítulos
anteriores e se caracterizavam pelas seguintes doutrinas:
* Yehweh não tem necessidade do Templo (66:1-2) – uma oposição à reconstrução
do templo, talvez um protesto contra a atitude antiga de localizar Yehweh apenas
no templo.
 * Desmistifica a prática do jejum, uma manifestação de penitência (58:1-12). Os
frutos da terra são um dom divino. Privar-se deles é despertar a compaixão do
dono. Na pregação do Trito-Isaías a verdadeira relação espiritual começa para além
do jejum e governa as disposições da alma com a prática da justiça e do amor (58:5-
7).
 * Sua missão (61:1) tem objetivos de reintegração e consolação. Entretanto, enfrenta
faltas graves, circunstâncias sociais e jurídicas catastróficas (57:1-3; 59:2,9). Enfrenta
a falta de fé (59:1) e emprega argumentos teológicos para explicar o atraso da
salvação pelo acúmulo de faltas cometidas (59:9). Por isso, o profeta é exortado a
“abrir, desembaraçar” o caminho (57:14; 62;10) para a transfiguração de Sião (60).
Este acontecimento causará um transtorno universal (56:1; 58:8,10-12; 62:1-3,11).
 Por causas de todas essas argumentações, desde o início do Século XX, tem
ficado cada vez mais comum o estudo do livro de Isaías considerando-se as
posições conservadora e liberal, esta última, dividindo assim o livro do profeta:
Is 1-39 – Proto-Isaías ou Primeiro Isaías (740 a 698 a.C.) – profeta histórico
do final do Século VIII a.C, em Jerusalém, reino do sul, Judá. Curiosamente, o nome
“Isaías” só aparece nas mensagens contidas nesta parte do livro. A experiência de
sua chamada está descrita em Is.6, com destaque para os versos 8 a 12: “Depois disto
ouvi a voz do Senhor, que dizia: A quem enviarei, e quem irá por nós? Então disse eu: Eisme aqui, envia-me a mim. 9 Disse, pois, ele: Vai, e dize a este povo: Ouvis, de fato, e não
entendeis, e vedes, em verdade, mas não percebeis. Engorda o coração deste povo, e
endurece-lhe os ouvidos, e fecha-lhe os olhos; para que ele não veja com os olhos, e ouça com
os ouvidos, e entenda com o coração, e se converta, e seja sarado. Então disse eu: Até
quando, Senhor? E respondeu: Até que sejam assoladas as cidades, e fiquem sem habitantes,
e as casas sem moradores, e a terra seja de todo assolada, e o Senhor tenha removido para
longe dela os homens, e sejam muitos os lugares abandonados no meio da terra”.Is 40-55 – Dêutero-Isaías ou Segundo Isaías (550 a 540 a.C.) – Trata-se de um
profeta anônimo, discípulo do primeiro Isaías(Is.8:16), que pregou mensagens de
esperança próximo ao fim do exílio, na Babilônia. É testemunha do avanço do
império medo-persa sobre os babilônios, no Século VI a.C. Provavelmente foi um
conselheiro espiritual dos exilados. A experiência de sua chamada está descrita em
Is.40, com destaque para os versos 3 a 9: “Eis a voz do que clama: Preparai no deserto o
caminho do Senhor; endireitai no ermo uma estrada para o nosso Deus. Todo vale será
levantado, e será abatido todo monte e todo outeiro; e o terreno acidentado será nivelado, e o
que é escabroso, aplanado. A glória do Senhor se revelará; e toda a carne juntamente a verá;
pois a boca do Senhor o disse. Uma voz diz: Clama. Respondi eu: Que hei de clamar? Toda a
carne é erva, e toda a sua beleza como a flor do campo. Seca-se a erva, e murcha a flor,
soprando nelas o hálito do Senhor. Na verdade o povo é erva. Seca-se a erva, e murcha a flor;
mas a palavra de nosso Deus subsiste eternamente. Tu, anunciador de boas-novas a Sião,
sobe a um monte alto. Tu, anunciador de boas-novas a Jerusalém, levanta a tua voz
fortemente; levanta-a, não temas, e dize às cidades de Judá: Eis aqui está o vosso Deus”
Is 56-66 – Trito-Isaías ou Terceiro Isaías (538 a 520 a.C.) – Trata-se de um
profeta, também discípulo da tradição Isaiana, vivendo em meio aos repatriados,
na Jerusalém pós-exílio, no Século V a.C., pregando contra antigos problemas que
se fizeram novamente notar na prática diária do povo. Sua experiência de chamada
está descrita em Is.61, com destaque para os versos 1 a 4: “O Espírito do Senhor Deus
está sobre mim, porque o Senhor me ungiu para pregar boas-novas aos mansos; enviou-me a
restaurar os contritos de coração, a proclamar liberdade aos cativos, e a abertura de prisão
aos presos; a apregoar o ano aceitável do Senhor e o dia da vingança do nosso Deus; a
consolar todos os tristes; a ordenar acerca dos que choram em Sião que se lhes dê uma
grinalda em vez de cinzas, óleo de gozo em vez de pranto, vestidos de louvor em vez de
espírito angustiado; a fim de que se chamem árvores de justiça, plantação do Senhor, para
que ele seja glorificado. E eles edificarão as antigas ruínas, levantarão as desolações de
outrora, e restaurarão as cidades assoladas, as desolações de muitas gerações”.
Mas, os que defendem a existência de três Isaías vão mais além do que
localizar cada bloco de texto em um determinado profeta. Mesmo partes dos
capítulos de 1 a 39 que, nessa linha, seriam da autoria do Isaías do Sec.VIII a.C., são
deslocadas desse tempo e jogadas para depois do Século V a.C., como ocorre com a
parte denominada “Apocalipse de Isaías”, capítulos 24 – 27, e ainda os capítulos 33
a 35 (GORGULHO, 2002, p.1238).
Resta-nos agora perguntar pelos argumentos contrários à tríplice autoria de
Isaías, favoráveis à unidade literária do livro. Utilizaremos as defesas de Archer
(1997), Geisler (1999), Fafasuli (1977) e Ridderbos (1986):
a) O fato do nome de Ciro aparecer na segunda parte do livro não indica
que os capítulos 40 a 66 tenham sido escritos por um discípulo de Isaías, cerca de
200 anos depois do profeta de Jerusalém. Isso só depõe a favor do elemento
sobrenatural nas profecias, visto que Deus sabe tudo de antemão. É como se o
profeta tivesse uma espécie de “bola de cristal” onde pudesse antever tudo com
detalhes, em função de uma experiência sobrenatural. Archer (1997, p.281) usa o
argumento que em Is.6:13 (aliado a 7:3) temos a profecia de que um resto do povo
de Judá retornaria do exílio e se o profeta Isaías cerca de 200 anos do fim do exílio pôde prever isso, então não seria anormal que o mesmo profeta pudesse falar no
nome de Ciro, o libertador dos judeus em 538 a.C.
b) As diferenças entre as duas (ou três) partes do livro podem ser explicadas
da seguinte forma: “Os capítulos 1 a 39 preparam o leitor para as profecias contidas
nos capítulos 40 a 66” (GEISLER, 1999, p.273).
c) Certas frases e palavras são encontradas em todo o corpo do livro, o que
atestaria a unidade literária do mesmo (FAFASULI, 1977, p.443). Como exemplos
temos as expressões “O Santo de Israel” (aparece 12 vezes em 1-39 e 13 em 40-66),
“alto e sublime” (6:1; 52:13; 57:15), “as vossas mãos estão cheias (contaminadas) de
sangue” (1:15; 59:3,7), “os que abandonam Yehweh” (1:28; 65:11), “redimidos de
Yehweh” (35:10; 51:11), “obra de minhas mãos” (29:23; 60:21), “renovo de minha
plantação” (5:7; 61:3), “cegos” (29:18; 35:5; 42:16-18) e “surdos” (29:18; 35:5; 42:18;
43:8).
d) O testemunho de Lucas em seu evangelho (4:17) é de que o rolo que Jesus
leu na Sinagoga era o do profeta Isaías e em Jo.12:38 temos a afirmação de que foi
Isaías quem fez a declaração que se encontra em Is.53:1. Alude-se aqui à crença
natural dos primeiros cristãos de que Isaías foi o autor, não só das palavras faladas
como das palavras escritas nos 66 capítulos de seu livro.
e) Ridderbos (1986, p.30) que também a tradição dêuterocanônica, por volta
de 180 a.C., fazia alusões a Isaías como aquele que “consolou os aflitos de Sião” em
Eclesiástico de Ben Siraq 48:22-25 numa interpretação do texto de Is.61:2ss. Pode-se
afirmar, então, que o autor do livro de Eclesiástico herdou um texto sem divisões.
f) Nos manuscritos do Mar Morto, cujos papiros foram encontrados em 1947
em Qumrã, ao sul de Jerusalém, datados de um período que vai de 150 a.C. a 70
d.C., não existe nenhuma pausa, espaço ou vácuo entre os capítulos 39 e 40,
indicando que o escriba essênio recebeu o texto para copiar com o formato de um
único escrito.
g) Se os capítulos 56 a 66 foram, de fato, escritos após o exílio com o retorno
dos repatriados, então há textos que estão fora desse contexto histórico. De acordo
com Archer (1997, p.283) existem indicativos de que em Is.57:4-5 (comparado a
1:29) a situação de idolatria reclamada pelo profeta está dentro das circunstâncias
históricas do reinado de Manassés (697-642 a.C.) e não do ambiente dos repatriados
no Século V a.C. Essas práticas envolviam sacrifícios de crianças próprios do culto
de Moloque, inexistente após o retorno do exílio babilônico. Em Isaías 57:7 a
referência aos “lugares altos” lembra, além do governo de Manassés, o período do
rei Acaz (743-728 a.C.), momento em que também se praticou esse tipo de
sacrifício. Já a expressão de Is.57:14 “aterrai, aterrai, abri um caminho” pressupõe
um momento anterior ao fim do exílio, preparando o povo para o retorno a
Jerusalém; além disso os textos de Is.60:15, 61:13ss e 62:4ss revelam uma Jerusalém
ainda solitária e abandonada. Para Ridderbos (1986, p.43) o único texto que pode
indicar circunstâncias históricas posteriores ao exílio é Is.60:17, “que dá uma forte
impressão de que a referência é a um templo mais belo, que tomou o lugar de um
mais pobre que existia na época em que estas palavras foram escritas”. Como vemos, temos bons argumentos, tanto de um lado quanto de outro.
Por isso, não é tão simples assim rejeitar a posição tradicional e aceitar
integralmente a posição liberal, da mesma forma que não é razoável acreditar que
todo o material constante nos 66 capítulos do livro tenha vindo do Isaías de
Jerusalém por volta de 740 anos antes de Cristo. Se podemos crer que os discípulos
de Isaías (8:16) não apenas conservaram mas também registraram suas mensagens
e as ampliaram, não podemos deixar de crer que o próprio Isaías recebeu de Deus a
ordem de escrever palavras para o futuro para que servissem de testemunho
(30:8). Como nos lembra Ridderbos (ibidem), a profecia foi, em primeiro lugar,
falada e depois, escrita; mas não como um texto narrativo seqüencial, onde uma
pessoa começa a escrever do capítulo 1 e tempos depois encerra com o 66. Boa
parte dos livros proféticos são coleções de oráculos divinos e que precisaram ser
compilados, algum ou muito tempo depois da morte do profeta. E isso não
impediu que nesse processo de compilação alguns acréscimos fossem feitos por
discípulos do profeta, mas de tal forma, que se referissem às primeiras pregações
do profeta sobre o desastre que ocorreria com o povo de Judá em 586 a.C. Contudo,
não é simples demonstrar como essa compilação ocorreu e quanto tempo durou,
visto que não temos informações precisas, apenas especulações de teólogos, tais
como Sellin-Fohrer (1980, p.571-573) e Sicre (1996, p.185-189). Então, o mais
prudente não seria concordar plenamente com as duas posições expostas aqui
sobre o livro de Isaías, mas considerar que existiram acréscimos posteriores ao
exílio babilônico que serviram como testemunho histórico para as profecias
anunciadas por Isaías durante seu ministério. De maneira alguma, o fato de terem
existidos acréscimos posteriores ameaçaria a fé, conforme vimos no início da
resposta a esta questão.

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